domingo, 10 de abril de 2011

Desfaleço

Alguém me sacode no corredor branco e grita: “Vamos, sua idiota, acorde!” Sem duvida alguma algum idiota sorri, não porque isso soa como imbecil, mas a sacanagem faz parte do universo.

Inocência desbotada ou só uma forma de continuar dando vida ao seu medo?

Do outro lado o homem bonito sorri, eu sei o que ele pensa, eu sei exatamente no que ele está pensando e sua voz soa como a voz de deus que feito nuvem ou trovão me diz para correr o risco.

Orgulho!

Não que ele seja parte indispensável, mas de repente e só por agora ele deita um tipo de prece. E eu quero estar no topo, eu quero estar no topo e não consigo me render a essa função secundária.

Qual o problema de se ocultar?

Por favor, amor, eu sei que não pode entender, mas eu estou com raiva, estou com muita raiva, porque todos esses conflitos que explodem dentro de mim, estão só em mim, ninguém sente, ninguém tem. Eu estou louca?

Inadequação?

Alguém estaria por algum momento perguntando por que diabos veio parar nesse mundo? Essa sensação de pertencer morre no momento seguinte, não se pertence a coisa alguma, resta a você, grande idiota, o mérito de ser um grande idiota.

Temos muito que preservar e para preservar alguém tem de morrer, alguém tem que pagar o preço.

Preço?

Minha amiga no trabalho me lembrava de manhã: “Qualquer escolha, qualquer caminho, qualquer decisão tem um preço. Você está a fim de pagar?”

E o caminho com coração?

Faça sexo! Faça sexo! Vamos todos fazer sexo em prol de uma vida mais prazerosa!

Mas que diabos! Que diabos! A brisa soprou e num instante se transformou num furacão. Eu acho que estou cansada e devia ter ouvido no momento em que os deuses disseram: “Criança, deixa disso e vai dormir”.

Por que eu quero ir embora? A casa é tão quentinha, o porão que me reservaram é tão doce e cheio de amor. Por que eu quero deixar o porão? Por que eu quero ir embora? Ele coloca um pratinho com pão e água todos os dias pra mim no porão, eu não morro de fome! Não morro, mas não vivo!

Não morro! Mas não vivo! Sobrevivo! E essa sociedade maldita ainda é quem decide o quanto eu posso usufruir do seu amor. Do SEU amor. Então, explique, docinho, por que a sociedade ainda é quem decide?

Bebo ácido no café da manhã, veneno no almoço e petróleo na janta! São Paulo é sujo e cinza, faz frio e para preservar a minha sanidade dou me religiosamente todas as tardes um pequeno pedaço de chocolate. Alguma coisa tem que dar prazer na vida!

“Coma chocolates, pequena suja! Coma chocolates”.

O sinal está fechado, as cortinas estão abertas, as pessoas estão sentadas na platéia... E onde eu estou?

Sabe, amor, eu quero te pedir que compre para mim um guarda-chuva. Parasol. E quando me trouxer, estarei sentada no meio de um jardim fumando um cigarro. E te ouvirei dizer: “Tão linda, vejo seus cabelos vermelhos voando”.

E eu? Eu desfaleço.

terça-feira, 5 de abril de 2011

Deuses

Houve uma vez em que eu fui transformada num mito, uma deusa muito bonita e maluca. Ofereceram um lugar bonito para viver, era tão bonito que eu mal podia acreditar que eu poderia ter uma morada tão bonita ao ser deusa. Mas havia alguma estranheza em meu endeusamento, porque havia algo de muito humano dentro de mim.

Dizia a lenda, que eu como deusa, poderia encher os lugares por onde eu passava com uma suave luz vermelha, exalando os perfumes adocicados como um suave sândalo, assim enlouquecendo todos e num belo dia eu encontrei um deus que me amava tanto quanto os mortais que me cultuavam em troca de alguma loucura. E ele era o mais bonito dos deuses e tinha um palácio todo em diamante e escrevia sonhos nas paredes brilhantes e espalhava uma luz branca que dizia encher de paz tudo aquilo que aquela luz tocava. Mas por ser um deus que fluía paz, tudo a seu redor sempre estava muito tumultuado, mas ele não podia entender isso. Como eu não podia jamais compreender a minha loucura e a minha divindade.

Numa tarde nós nos sentamos num jardim bonito e suspenso feito para os deuses e eu disse  que eu estava assustada com a minha nova condição de deusa, dizia para ele o quanto era difícil ter de lutar com a maldição que é dada apenas para os deuses e que minha maldição era a de sempre ser louca e com isso me tornar um problema para as pessoas. E ele tocou a minha mão e disse que não importava se homem ou deus, todos nós tínhamos problemas. E eu perguntei como ele se sentia, sendo um deus que fluía a paz, mas ao mesmo tempo só estava em lugares onde sua paz era de extrema necessidade. E ele me disse que se sentia triste também.

Calamo-nos e todo o universo se desenhou em nosso silêncio de deuses.

A brisa soprou as copas das arvores do jardim e nossos pés foram cobertos pela queda do outono. Então eu desenhei algumas coisas no chão arenoso e coloquei algumas sementes no banco em que estávamos sentados. Aqueles deuses antigos, que todo mundo conhece, de vez em quando passavam por esse jardim para ver os novos deuses e brincar um pouco com seus destinos. Mas, enfim, ninguém sabia de nada e o jardim cantava a musica de sempre. Segurei as pontas do meu vestido e sussurrei algo como: “Eu só queria um pouco de paz”. Então ele segurou a minha mão e lamentou: “E eu um pouco de loucura”.

Rimos o riso dos deuses jovens. E depois eu simplesmente chorei. Ele me disse adeus e eu também. E as flores já estavam murchas e as folhas já estavam todas no chão. E um deus do inverno passou com a sua carruagem. Ele voltou para o seu palácio e eu para meu reino vermelho. Porém conta a lenda que deuses jovens não sofrem. E eu mordi uma maçã e ele pintou um quadro. E não sei quanto tempo se passou...

domingo, 3 de abril de 2011

Subtração

Estou há um passo de começar tudo de novo. Começar tudo de novo... Isso deveria ser algo que me pusesse em algum ponto em branco do universo. Aumento a musica e acendo mais um cigarro, enfim sozinha...

Talvez isso soasse um pouco como Marta e um gengibre tolo, isso significa que o tempo é quem decide a coisa toda... O tempo... Largo as mãos ao longo do corpo, o relógio continua rodando embora eu pensasse em tirar suas pilhas. E eu olho o visor do meu celular. Mais um final de semana...

Divisão, multiplicação, soma e isso tudo é igual à subtração. Subsistir, subversão, subjetivo, substrato, submisso e enfim subtraio e resta apenas um. A matemática é sempre a linguagem do universo... Une o verso, sem rima, sem choro e sem poesia. Um.

Um amigo diz para eu procurar o meu atavismo e eu penso que ele só está chateado comigo, chateado com coisas que ele jamais se permitiria dizer, como um louco que berra suas sandices para as paredes de seu quarto. Mais um e subtraio.

E não estaria eu também chateada com ele? Não estaria eu com medo de perdê-lo? Mas sigo e vou sem ele, sentindo-me em paz comigo mesma. Quando estamos sagrando nada do que é dito ou silenciado faz qualquer diferença. Eu chorei como sempre chorei, mas hoje não, hoje eu dou tchau. Até mais meu amigo.

E o vento sopra como sempre soprou, mas é a chuva que dá à palidez do dia um tom entristecido. E eu me pergunto: Estou eu triste? E pelo que eu deveria entristecer? Por alguém que me esquece ou por alguém que prefiro esquecer?

O som das ruas enlameadas com seus asfaltos frios, os pés o chão tocam e no labirinto é a escuridão quem decide. O que há dentro desse vazio se não um anseio pelo recomeço. O zero é só mais um ponto e o ponto em si não é nada, mas ainda existe algo que me cala e é assim que são as longas madrugadas, do amor, do sono e do esquecimento. Esquecimento... Aquecimento... Cimento... É o que há de concreto! Não somente algumas lamúrias, mas aqueles prédios, os prédios que tanto me encantam pela manhã...

E o sono é o silêncio dos pensamentos. O sono é e tão somente significa isso. Dormir é tão prazeroso quanto contar quantos números haverá na próxima equação. Desperta então o morto e o que é adormecido é simplesmente compreendido. Querido é só mais um dia, só mais um dia e eu subtraio.

E estarei certa, estarei certa se acreditar que ninguém mais verá isso? Estarei certa que o vento irá mais uma vez soprar e o começo será um ônibus que me levará para o outro lado da cidade e alguma musica que tocará nos fones de ouvidos? Tão certo como a segunda-feira pode ser, tão certo que chega a ser dolorido e eu ainda posso estar profundamente enganada.

Ficção ou mito, não importa. A chama que acende é sempre a mesma que apaga. E você não me vê. E não mais contarei as horas ou estarei certa pela semana, enganada pelo sábado, indisposta no domingo. O sol há de brilhar um dia desses e o choro não será senão água salgada e alguém como eu ainda estará sentada na mesma calçada, fumando o bendito cigarro de todas as horas. Alguém como eu sempre há de amar alguém como você.

Alguém como eu. Alguém como você. Algo como isso. Algo como aquilo. Isso é tão cansativo... Tão cansativo quanto subir aquela bendita ladeira pela trigésima vez. O trigésimo primeiro deveria ser mais que abençoado, mas não há bênçãos que consigam ultrapassar os finais de semana. E isso é tão triste, tão triste, como saber que jamais lerá nada a respeito disso ou tal como isso.
Subtraio.
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